quinta-feira, 14 de julho de 2011
Eu fui traída!
Jaime Kemp*
Nos momentos de angústia e dor precisamos nos lembrar de que Deus não nos conforta somente para que nos sintamos confortáveis, mas para que confortemos a outros
Fiquei muito preocupado quando Cíntia chegou ao meu escritório, pois ela estava visivelmente transtornada. Ela era uma jovem senhora de 29 anos e mãe de um filhinho. Sem poder conter as lágrimas, Cíntia logo começou a contar-me sua história.
“O meu marido, Renato, e eu fomos criados em famílias cristãs, ambas bastante estáveis. Crescemos juntos freqüentando a mesma igreja, indo à escola dominical e cantando na equipe de louvor. Namoramos, noivamos e casamos virgens, e quando nasceu nosso filhinho o dedicamos ao Senhor. Juntos nós também orientávamos o grupo de adolescentes, éramos professores na escola dominical e toda semana comparecíamos fielmente a uma reunião de estudo bíblico. Porém, o que parecia ser um ótimo casamento, feliz e harmonioso, de repente se tornou um pesadelo, uma noite escura.
Quando tudo aconteceu fiquei um bom tempo parada ao lado da mesa da saleta que servia de escritório em casa, com a gaveta escancarada, segurando em minhas mãos algumas passagens de avião. Havia um total de seis bilhetes, três viagens de ida e volta para dois, em nome de Renato. Já fazia mais de um ano que eu não viajava com meu marido, e a simples suspeita do que aquilo poderia significar fez meu coração começar a bater acelerado, dando-me a impressão de que estava na minha garganta. Senti-me sufocar.
Aquilo não podia estar acontecendo! Eu não queria acreditar na evidência, mas ao mesmo tempo era compelida a buscar uma prova mais concreta. Nessa busca descobri o inevitável, uma realidade dolorosa que não deixava dúvidas. Bilhetes de teatro para duas pessoas, notas de restaurante que coincidiam com várias noites que
Renato tinha ficado ‘trabalhando até mais tarde’, e outras passagens de avião que indicavam que ele chegara à nossa cidade dois dias antes de vir para casa. Meu marido estava tendo um caso! Todo o meu corpo começou a tremer e a minha cabeça a girar. De alguma forma, naquele turbilhão de incredulidade, dor, raiva, sentimentos de rejeição e tristeza, eu percebi que minha vida nunca mais seria a mesma.
Foi como se a verdade retirasse uma venda dos meus olhos e aguçasse minha mente, pois repentinamente tudo começou a fazer sentido. A frieza com que Renato vinha me tratando nos últimos tempos; o fato de ele estar sempre ocupado com os negócios; as noites em que chegava tarde do trabalho e as freqüentes viagens a serviço da empresa. Tudo fazia parte de um teatro barato, de uma camuflagem rota. Eram mentiras covardes imaginadas para encobrir sua infidelidade.
Gotas de suor brotaram em minha testa e recomecei a tremer. Minha primeira reação foi sair correndo até o chaveiro mais próximo e mandar trocar todas as fechaduras, para que quando ele chegasse não pudesse entrar mais em casa. Eu não queria mais vê-lo em minha frente. Mas não fiz nada daquilo. Fiquei parada no meio da sala enquanto aquela dor inclemente tomava conta de mim. Vagarosamente, sentei no sofá em que tantas vezes nós havíamos conversado, planejando nosso futuro e sonhando juntos.
Então, chegou o dia em que tive que confrontar Renato sobre sua traição. Imediatamente, como se fosse para ele um alívio, meu marido confessou o adultério e fez questão de afirmar que estava apaixonado por outra. Na mesma entonação, como se informasse algo banal como ‘estou indo à padaria’, sem o menor traço de culpa ou remorso, ele disse: ‘Já faz tempo que não me sinto feliz com você, com o nosso casamento. E já que mais cedo ou mais tarde eu vou embora mesmo, acho que é melhor ir agora’.
Ele nem se deu ao trabalho de vestir o paletó. Seu rosto transparecia uma dureza, uma insensibilidade que eu nunca havia visto antes. Fiquei completamente confusa! Naquele instante, senti ao mesmo tempo amor e ódio por ele; queria que Renato fosse embora, mas também desejava segurá-lo ao meu lado para sempre. Ele se virou e caminhou em direção à porta: ‘Você não precisa mais me esperar!
Não vou voltar’.
Não tive forças para responder. Não sei quanto tempo fiquei parada olhando a rua deserta, depois que o carro desapareceu de vista. A sensação que eu tinha era de estar vivendo a história de outra pessoa. Durante toda aquela noite, na casa silenciosa, apenas o meu choro ecoava. Eu andava para lá e para cá chorando; entrava e saía do quarto do bebê sempre chorando.
Cerrei meus punhos, levantei-os em direção ao céu e disse: ‘Deus, quero que o Senhor saiba que se este é o seu plano para a minha vida, ele é uma droga! Eu odeio meu marido e odeio o que o Senhor está fazendo comigo e com o meu filho!’.”
Foi assim que, profundamente ferida e angustiada, ela contou todo seu drama para mim. Talvez o que aconteceu a Cíntia seja semelhante à sua própria história. Infelizmente, é a mesma história de muita gente. O fato é que nossa sociedade está transbordando de relacionamentos quebrados e sonhos desfeitos. Quer seja o romance de dois jovens terminando o Ensino Médio ou de um casal mais maduro, todos estão sujeitos a se deparar com ventos contrários. Se o barquinho em que navegam não conseguir enfrentar o mar revolto, logo afundará.
Pensando no que ocorreu no casamento de Cintia e Renato quero compartilhar alguns conselhos sobre os quais conversamos no decorrer de várias sessões, especialmente visando diminuir a angústia que ela sentia.
- Cíntia, sei que este é um momento de profunda dor e aflição. Certamente, vários questionamentos estão agora bombardeando sua mente e trazendo confusão ao seu coração. Lembre-se, algumas flores, como a rosa, precisam ser esmagadas para que sua fragrância exale. Algumas frutas precisam ser espremidas para liberarem sua doçura. Alguns metais, como o ouro, devem ser colocados na fornalha para atingir um grau significativo de valor e pureza.
O mesmo acontece conosco. Muitos precisam ser humilhados antes de ser exaltados. O oleiro precisa quebrar o vaso para utilizar o mesmo material em um vaso novo e atraente. Nossos corações precisam ser quebrados para que deles escorra um conteúdo precioso, de forma a abençoar outros. Nos meus momentos de angústia e dor eu também preciso me lembrar de que Deus não nos conforta somente para que nos sintamos confortáveis, mas para que confortemos outros (2 Coríntios 1.3-4).
Quando Deus, com uma mão, nos envia uma provação ou permite uma dificuldade, com a outra Ele nos oferece graça para enfrentá-las. Portanto, o Senhor pode transformar as provações em triunfos, os pesos em penas. As aflições, em vez de serem colchões de espinhos, tornam-se lençóis de pétalas de rosas. Perdas convertem-se em ganhos. Bênçãos disfarçadas e anjos camuflados por um breve momento são mensageiros dos céus que vêm para nos abençoar e tornar nossa imagem mais parecida com a do Amado, o Filho de Deus.
Cíntia, estou tentando confortá-la e consolá-la porque neste momento você está percorrendo sua ‘Via Dolorosa’. Lembre-se, foi exatamente este o caminho que Jesus já trilhou para nos dar vida, e saiba que Ele sempre quer andar ao seu lado.
Dor, sofrimento e adversidade fazem algo extremamente significativo em nosso caráter. Deus está no ramo de transformar nossas vidas, preparando-nos para o seu serviço.
Não se esqueça de que em instante algum achei que foi Deus quem planejou a traição do seu marido. Tampouco creio que Ele se alegra com qualquer tipo de tragédia em sua vida. No entanto, creio firmemente que Ele é mestre em mudar tragédias em bênçãos. Será que Jesus sabe o que significa ser traído? Lembre-se de que foram as gotas de suor por Ele derramadas que se transformaram em sangue durante a agonia no Getsêmani. Traumas, perdas e traições: Ele passou, Ele conhece.
Qualquer que seja sua perda, e sei que é grande, quero convidá-la a atender ao convite que o próprio Jesus lhe faz: ‘Venham a mim, todos vocês que estão cansados de carregar as suas pesadas cargas, e eu lhes darei descanso. Sejam meus seguidores e aprendam comigo porque sou bondoso e tenho um coração humilde; e vocês encontrarão descanso. Os deveres que eu exijo de vocês são fáceis, e a carga que eu ponho sobre vocês é leve’ (Mateus 11.28-30 – Bíblia da Família NTLH– SBB).
* Jaime Kemp é doutor em ministério familiar e diretor do Lar Cristão. Foi missionário da Sepal por 31 anos e fundador dos Vencedores por Cristo. É palestrante e autor de 50 títulos. Casado com Judith, é pai de 3 filhas e avô de 3 netos.
Fonte: http://www.larcristao.com.br
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