quarta-feira, 5 de março de 2014

Pr. David Baeta, o preletor excelente (II)


TEMA GERAL: “As Dores do Ministério Pastoral (II Parte)”
TEMA ESPECÍFICO: “Saindo do Exílio Cinzento”
Texto Bíblico: Salmo 51
09/05/2012 – Retiro da OPBB/FLU (Rio Bonito/RJ) - David Baêta Motta

CONSIDERAÇÕES INICIAIS
1) Retomo neste momento o assunto da primeira palestra, abordando agora o seu lado mais factual e prático. Inicialmente falarei sobre o contexto maior que originou o pecado de Davi com Bate-Seba e suas consequências. A seguir farei uma breve análise do Salmo 51 que demonstra o posicionamento que David assumiu diante do sofrimento que se abateu sobre ele quando caiu em si. O terceiro momento será de compartilhamentos conclusivos.

2) Antes de entrar definitivamente no meu assunto de hoje, preciso fazer algumas considerações preliminares. Lendo um livro nos EUA o autor dizia que “se você fala com Deus você é religioso; Mas, se Deus falar com você, você é um psicótico”. Claro que esta assertiva não é verdadeira. Creio que Deus nos fala através de pensamentos que não são nossos, mas nos vêm seja num momento de profunda reflexão ou através de outras fontes, como pessoas, livros, etc. Isto é um dos atos milagrosos do Senhor (o Deus que fala) para nos aliviar das dores no ministério pastoral.

3) Outro fato é a nossa postura diante do sofrimento no ministério pastoral. Há muita gente sofrendo. Muitos pastores, muitas esposas e filhos de pastores. Relacionamentos frustrados e mascarados de bênção, medo de procurar ajuda e se expor, frustrações pessoais frente a alvos não alcançados, integridade partida circunstancialmente. De certa forma é assim que vemos Davi; Um Homem em Buscar da Recuperação da Integridade Partida.

4) Disse na palestra anterior a esta que há dois tipos de pessoas: as que naturalizam o pecado e as que são surpreendidas, caem, mas sofrem com o que fizeram, sofrem por terem caído nas armadilhas sutis.
5) Reafirmo que o meu foco está mais voltado para os aspectos subjetivos daquele que desenvolve o ministério pastoral, tomando como base erros cometidos ao longo da vida e suas consequências, bem como a postura que se deve assumir.

TRANSIÇÃO: Como devemos nos posicionar diante dos sofrimentos no ministério pastoral?

I – DEVEMOS ESTAR NO LUGAR EM QUE DEUS QUER QUE ESTEJAMOS
1) Repito aqui o texto inicial que apresenta o cenário em que Davi cometeu o adultério e assassinato: “Um ano depois, na época em que os reis tinham o hábito de sair à guerra, Davi enviou Joabe, seus oficiais e todo o Israel com a missão de eliminar de uma vez por todas os amonitas. Eles cercaram Rabá, mas, dessa vez, Davi permaneceu em Jerusalém. Certo dia, Davi levantou-se do seu descanso da tarde e foi passear no terraço, e viu uma mulher tomando banho, e ela era muito bonita (...) Davi ordenou que a trouxessem”. (2 Samuel 11.1ss - A Mensagem).

2) Davi poderia entrar para a história como o maior “garanhão do Antigo Testamento” de que se têm notícias. Ele era extremamente compulsivo neste aspecto de vida; a sexualidade como ato. Creio que pior que ele só mesmo o seu filho Salomão.

3) O grande problema que vejo aqui é aquele detectado pelo texto básico. Davi não estava onde deveria estar. Quando não estamos onde Deus quer estejamos, tornamo-nos presas fáceis das situações de vida que posteriormente nos trazem dor e sofrimento.

4) Como disse na palestra anterior, Davi com seu senso de onipotência, com a sua falta de limites, achando que por ser rei ninguém iria questioná-lo, ordena que lhe trouxesse Bate-Seba, adultera com ela, ela engravida, ele arma uma situação para que o marido se deitasse com ela e depois achar que o filho era dele. Como nada deu certo Davi arma uma situação para a morte do marido traído. Davi comente um crime doloso.

5) Alguém precisaria colocar Davi nos eixos. Até então, ele achava que tudo estava normal. Entretanto, em seu interior algo se movia negativamente. Sentimentos de culpa e vergonha iam ganhando espaço em seus pensamentos. Suas emoções começaram a adoecer. Até que o ousado e usado profeta Natã entra em cena.

6) A imagem que tenho na mente é de um Davi fazendo pose de bom para os outros, mas nos subterrâneos de suas emoções ele sofria de modo inimaginável. Imagino também o Senhor virado para Davi e este de costas para o Senhor pelo senso de vergonha e culpa.

7) Natã aparece e através de uma história enredante ele coloca Davi de frente para Deus. Fantástico isto. Davi precisava se posicionar. Lembra-se do que disse na palestra anterior? Ou nos tornamos masoquistas e gozamos com o sofrimento, ou assumimos posicionamento em relação a ele.

8) Davi estava cansado. Ele estava extenuado. Ele não suportava mais aquela situação. Creio que o que mais lhe afetava era o sentimento de estar “de mal” com Deus ou, quem sabe, ele pode ter sido tomado por um profundo sentimento de vergonha de Deus. Este também foi o sentimento de Jó, só que ao contrário; ele achava que o Senhor lhe virara o rosto e ele não sabia o motivo. Davi se posiciona e é exatamente isso que veremos a seguir numa breve análise do Salmo 51 que é a mais notável das orações penitenciais dos Salmos.

II - SAINDO DO EXÍLIO CINZENTO
1) Começo com o v.1: “Tem misericórdia de mim, ó Deus (אלהים ’elohiym), segundo a tua benignidade (חסד hesed); apaga as minhas transgressões, segundo a multidão das tuas misericórdias (רחם racham  Entranhas)”. Havia duas tradições em Israel: uma Eloísta e outra Javista. Em tempo de desespero, com certa raridade, algumas pessoas misturavam as tradições. A primeira ligada do Deus Criador; o Deus da adoração patriarcal. A segunda ligada à revelação de Deus a Moisés do seu nome pessoal, bem como do seu amor fiel. Em seu desespero Davi não roga por justiça, mas por misericórdia e graça.

2) No v.2 Davi faz um apelo tremendo: “Lava-me (כבס kabac) completamente da minha iniqüidade, e purifica-me do meu pecado.” A metáfora que explica o verso, de modo mais específico o verbo lavar, é aquela de se pegar uma roupa muito suja, passar bastante sabão, bater com a roupa em uma madeira ou pedra, de modo que a sujeira saia completamente. É o desejo ardente de ser livre de sua compulsão. Traduz também a ideia de limpar a mente de onde partem os pensamentos que se materializam através de atos comportamentais.

3) Atente para a declaração do verso 6: “Sei que desejas a verdade (אמת ’emeth) no íntimo(טוחה tuwchah); e no coração me ensinas a sabedoria.” Este verso está em comum acordo com o anteriormente comentado. Deus não está interessando em comportamentos num primeiro momento. Deus está interessado naqueles pensamentos secretos que povoam a nossa mente. Íntimo significa “regiões interiores, recantos secretos, partes internas”.

4) De coração, o verso que mais me encanta neste Salmo penitencial é o de número 11: “Cria em mim, ó Deus, um coração puro, e renova em mim um espírito reto.” O verbo “criar” é oriundo da história da criação e é ato exclusivo do Deus que do nada faz surgir algo novo. Em hebraico é ברא bara’. Este verbo foi usado por Moisés em dois momentos especiais na história da criação. O primeiro momento foi no início da criação em si. No princípio criou Deus os céus e a terra (Gn 1.1). O outro está em Gênesis 1.27 quando se diz que “Criou Deus, pois o homem à sua imagem, a imagem de Deus o criou...”.

5) Davi usa as duas imagens em sua oração. Na primeira imagem ele se vê como um nada e roga a Deus que faça algo novo em sua vida. Na segunda ele se vê como um boneco de barro sem o fôlego da vida. Então ele roga ao Deus criador que sopre sobre ele o seu רוח ruwach, o seu vento sobrenatural. Ele evoca a ideia de mistério, poder e ação.

6) O último verso que gostaria de fazer menção é o 11: “Não me expulses da tua presença, nem tires de mim o teu Santo Espírito.” O Santo Espírito era considerado um “agente de habilitação” enviado por Deus para pessoas específicas e para situações concretas (veja o relato dos Juízes). Davi viu o que aconteceu com Saul quando dele se retirou o Espírito de habilitação. Davi presenciou o desespero e as crises de Saul bem como a mudança de foco que lhe ocorreu. Davi viu que Saul praticamente perdeu o senso crítico, o juízo e ele, Davi, não queria sofrer a mesma coisa.

III – DEZ PASSOS PRÁTICOS DIANTE DAS DORES DO MINISTÉRIO PASTORAL
1) Explicite para si mesmo e o faça com clareza e com detalhes o seu problema, aquele que lhe causa dor e sofrimento.

2) Procure ajuda o mais rapidamente possível antes que a dor e o sofrimento se instalem definitivamente em você.

3) Fuja da tentação de ser o Todo-Poderoso. Deixe que Deus mesmo desempenhe esse papel que é atributo somente dele.

4) Creia que há muita gente que deposita confiança em você. Sua queda pode ser a queda delas também. Mantenha o foco.

5) Construa amizades e não concorrências. A amizade sincera e confiável é básica no compartilhamento da dor e do sofrimento no ministério pastoral.

6) Esteja onde Deus quer que você esteja e não onde você ache que deveria estar.

7) Quanto maiores são os seus poderes, maiores serão as suas responsabilidades. Deus nos dota com poder sobrenatural.

8) Não se esqueça de que todos nós precisamos de um Natã, alguém de Deus que nos faça voltar a Deus.

9) Esteja disposto a dizer “sim” para Deus e “não” para você. Negar a si mesmo é uma das virtudes daqueles que desejam seguir a Jesus (ver o Advogado do Diabo no seu discurso sobre Deus).

10) Tenha disposição para se posicionar diante de Deus. Abra seu coração para ele e revele os subterrâneos das suas emoções. Ele ama a verdade no íntimo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
1) Reafirmo o que tenho dito ao longo destas duas palestras. O sofrimento faz parte da nossa vida e tudo depende da maneira como nos posicionamos diante dele. Disse-lhes na palestra anterior sobre o espectro de morte que se faz presente diante de uma doença com características letais.

2) Preciso lhe dizer que pela graça de Deus tenho superado isso também, pois a cada dia Deus me tem dado um profundo amor pela vida e uma incrível disposição de passar pelos sofrimentos lutando pela vida.

3) Preciso também lhe dizer que se você está às voltas com a amargura e sofrimento por um ato cometido contra a natureza divina e que vai de encontro à sua vocação, acredite: Há esperanças para você como houve para Davi. Deus adora trabalhar com pássaros de asa quebrada.

4) Deus deseja retirar você do “exílio cinzento” e lhe dar novamente a alegria representada pelas cores da vida. Eugene Peterson em sua paráfrase de Bíblia usada por mim nestas palestras traduz assim o Salmo 51.12: “Traz-me de volta do exílio cinzento, sopra um vento novo em minhas velas.” Clame a Deus e ele fará isso em e por você.

5) Lembre-se da belíssima poesia do hino que diz:

Envolvido em densas trevas
Almejava a luz do céu,
Bem sentindo meus pecados,
minha condição de réu.

Ó meu Mestre poderoso,
Forte e terno Salvador,
Rompe os laços que arruínam
Minha vida, ó meu Senhor!

Um comentário:

  1. Estava nesse dia, ouvi essa mensagem e pensei: Só Deus mesmo para dar força e sabedoria. Pr Baeta era um homem de Deus.

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