Entrevista: Isaltino Gomes Coelho Filho
Casal Feliz entrevista nesta edição o pastor Isaltino Gomes Coelho Filho. Ele é casado há 40 anos com Meacir Carolina. Nessas quatro décadas de casamento, Deus deu-lhes três filhos: Beny, Nelya e Camila. Todos casados. Desses casamentos, três netinhos (todos nascidos na região amazônica) alegram os avós Isaltino e Meacir. De Macapá, onde é pastor, Isaltino concedeu a presente entrevista, que toca num assunto muito importante: o divórcio.
CF: Recentemente a imprensa noticiou que o número de divórcio no país subiu assustadoramente. Já estamos vivendo no Brasil uma “epidemia de divórcios”? Por que chegamos a este estágio?
IGCF: Não classificaria como uma “epidemia”. Creio, porém, que o aumento no número de divórcios se deve a vários fatores: o esgarçamento da moralidade, que faz com que votos de fidelidade conjugal sejam vistos como “caretas”, a falta de preparo de muitos nubentes, sem qualquer noção do passo dado e, ainda, uma grande dificuldade das pessoas, perceptível em várias áreas da sociedade, em querer insistir, em lutar para obter algo. As pessoas querem resolver as coisas com rapidez. Um obeso levou vinte anos engordando, sem disciplina alguma, mas quer emagrecer com uma cirurgia ou com pílulas. Não quer fazer esforço algum. Por vezes, penso que estamos formando uma geração desfibrada, incapaz de se determinar, mas que deseja as coisas prontas e que se rende se não as obtém facilmente. Quando não consegue, logo desiste. Investir num relacionamento para ter um casamento feliz exige disciplina, correção, mudança de rota, novas atitudes. As pessoas não querem abrir mão de nada. A fartura da sociedade tem produzido frouxidão de vida.
CF: Nas pesquisas do IBGE, Rondônia e Distrito Federal foram os estados que tiveram o maior número de divórcios. Em que sentido um estado ou uma cidade podem influenciar as pessoas a procurarem o divórcio?
IGCF: Quando morei em Brasília da primeira vez (1984-1993), a cidade era apontada como a campeã do divórcio no Brasil. Deram-me duas razões. Uma de ordem econômica: o casal se divorciava de fachada, e assim cada um tinha direito a um imóvel funcional. Continuavam juntos e alugavam um dos apartamentos. Não levei a sério. Outra razão, para mim mais sensata: onde há grande mobilidade humana, constante chegada e saída de pessoas, há mudanças sociais e de hábitos. Numa cidade pequena, o casal é mais orientado pelos familiares, tem muita gente a quem deve mostrar uma imagem. Mudando-se, o casal fica vulnerável, nem sempre se adaptando à mudança e não tendo mais a rede de parentes e amigos que os ajudava ou “mantinha na linha”. É um fenômeno observado em centros que se urbanizam rapidamente. Não disponho de observações que me permitam asseverar com absoluta segurança, mas avento a possibilidade. No passado, a Estação Júlio de Mesquita, em São Paulo, onde chegavam trens vindos do interior trazendo migrantes para a cidade, era chamada de “O lugar onde a fé fica”. Os migrantes, saídos de cidades pequenas, de domínio católico, chegavam à capital paulista e se envolviam com as igrejas evangélicas. Uma razão dada foi esta: a falta de controle social dos parentes e amigos anteriores, e a perda de raízes. Isto acontece na área conjugal.
IGCF: Orientá-los sobre o casamento. Eu me casei sem qualquer curso, sem qualquer orientação, até mesmo de casa. Deu certo pela graça de Deus e pela consciência que Meacir e eu nutrimos de que casamos para dar certo. Todavia, receio que nós evangélicos tenhamos uma visão muito secularizada do casamento. Não o vemos como um sacramento, mas não podemos esquecer sua espiritualidade e sua relevância aos olhos de Deus. Apontaria também uma incrível falta de reflexão nas igrejas, mais dadas ao emocionalismo e ao experiencialismo. Outro fato que me incomoda é a extinção das antigas organizações de treinamento e de crescimento cristãos, que abordavam esses temas. A queda de frequência à EBD também me parece somar, pois os espaços na igreja para estudo e reflexão têm diminuído. Há muita celebração e pouco estudo e reflexão. Para alguns, refletir soa como ofensa.
CF: Um dado revelado por instituições americanas apontou que o número de casais que pedem o divórcio entre não crentes é o mesmo entre os crentes. Como o senhor analisa este dado americano?
IGCF: Como uma declaração de que as igrejas estão falhando nesta área. Sou pastor há mais de 40 anos e sempre dei muito valor ao aconselhamento. O que escuto morre comigo. Mas tenho observado que os problemas do mundo estão presentes na igreja. Digo isso com tristeza: o modo de vida privada da maioria dos membros de nossas igrejas em nada difere do modo de vida das pessoas sem Cristo. Temos muita festa e pouco Cristo. Usando com outra conotação o termo de Teilhard de Chardin, e adaptando-o a Gálatas 2.20, há pouca cristificação dos crentes. Há pessoas nas igrejas que nada sabem sobre a proposta de vida do evangelho de Jesus.
CF: Voltando aos dados do IBGE, entre os pedidos de divórcio não consensuais, a iniciativa foi da mulher em 70,5%. Qual sua avaliação deste dado?
IGCF: Não reparara nisto. Receio que qualquer avaliação seja precipitada. À primeira vista talvez seja porque hoje a mulher não está dependendo de um marido para sobreviver.
CF: Como pastor, como o senhor tem tratado este tema em seus ministério?
IGCF: Tenho feito palestras sobre o assunto. Tenho pregado sobre família. Tenho promovido a literatura sadia sobre vida conjugal (há muita pieguice sem base na área) e tenho me mostrado acessível aos casais. Como Meacir e eu vivemos muito bem, sinalizamos aos casais que é possível viver bem, e nos mostramos acessíveis a eles. Ensinamos o valor da família e buscamos criar na igreja um ambiente espiritual que leve as pessoas ao crescimento e à maturidade cristãos. Muitos problemas nos casamentos não são de ordem relacional, mas apenas demonstrações de imaturidade espiritual. Tenho me impressionado com a fragilidade espiritual dos cristãos, com a sua dificuldade de aplicar às suas vidas os princípios da Palavra de Deus, e também com a fraqueza de púlpitos que não encharcam as pessoas de Bíblia. Há muita frase feita, chavões, inflexão de voz bem feita, mas uma escassez de ensino bíblico que choca. As pessoas sequer sabem manusear a Bíblia. Preguei uma vez em Naum 1.7, e depois de ter anunciado onde estava o texto observei a dificuldade da maioria dos crentes em localizar o versículo. Inclusive do dirigente do culto. Sem embasamento bíblico não se tem uma igreja forte.
CF: E em relação as pessoas já divorciadas, como a igreja tem agido?
IGCF: Pessoalmente não vejo o divorciado como um leproso espiritual, mas como alguém ferido. Um divórcio sempre deixa marcas e fragiliza a pessoa, a não ser que esta seja absolutamente insensível. Fui pastor de uma igreja que era ironizada por alguns colegas como “a igreja dos riquinhos e dos divorciados”. Parece que estes eram, para eles, dois pecados imperdoáveis: ter bens e ter enfrentado um revés no casamento. Muitos divorciados procuravam nossa igreja porque sabiam que seriam respeitados e tratados. Mas em regra geral, vejo que a maior parte das igrejas não tem refletido sobre isso. Há divorciados que devem mesmo ser ajudados e há alguns que precisam de repreensão espiritual. Porque há gente que age erradamente. Enfrentar um divórcio não é o ideal, mas entende-se. Quando, porém, uma pessoa entra em três casamentos e se divorcia nos três, há alguma coisa a se ponderar em sua vida. Ou ela escolhe muito mal ou não sabe conviver com as pessoas e precisa de ajuda e até de correção.
CF: Qual é o seu sentimento, como pastor, quando um casal de sua igreja pede o divórcio?
IGCF: Frustra-me muito. Houve um casal com que trabalhei uns quatro anos, ajudando no que podia. Quando saí de férias, ele se divorciou. Durante muito tempo culpei-me e às minhas férias. Custei a entender que eu não podia ser o ponto de sustentação de um relacionamento.
IGCF: Vamos lá:
1. Façam um casamento a três, com o Senhor Jesus como participante.
2. Como consequência, ponham-se ambos sob a orientação do Senhor.
3. Orem juntos. O hábito de um casal em cultivar vida espiritual no quarto ou fora do templo cria um vínculo entre os dois. Como disse alguém: “É difícil brigar com uma pessoa com quem você ora todos os dias”.
4. Ponha o outro em primeiro lugar. Não espere receber amor. Ame. Quem ama recebe amor.
5. Aprenda a aceitar o outro. Namoramos a pessoa ideal, mas casamos com a real. O processo de aceitação e adaptação ao outro é fundamental.
6. Não cobrem. Isto mata qualquer relacionamento.
7. Lembre-se: amor não é melosidade, mas ação doadora: “Deus amou o mundo de tal maneira que deu…”. Apesar de um livro sobre casamento se intitular “Amor, um sentimento a ser aprendido”, amor não é sentimento. É ação.
8. Queira que o casamento dê certo. É maligna e obtusa aquela frase: “Se não der certo, a gente se separa”. No tempo dos planos econômicos mirabolantes surgiu uma frase para subsidiar um deles: “Tem que dar certo”. O uso deste lema foi infeliz, mas seu conteúdo deve ser aplicado a cada casamento: é para dar certo.
9. Muita coisa não depende de Deus (e longe de mim o negar sua soberania – que os calvinistas não me malhem). Depende de nós. Deus deseja que vivamos bem. Nós é que estragamos. Que o casal se vigie neste aspecto.
10. Muita coisa não depende do outro, mas depende de mim. É outra lembrança a guardar. Eu precisei mudar muito para merecer a esposa que tenho. Ela me civilizou. Mas eu tive pelo menos um mérito: aceitei que ela me civilizasse. Ela nunca foi problema. O problema era eu. Muita gente quer mudar seu cônjuge, mas não se vê como é, e não quer se mudar. Aliás, creio que foi Mark Twain quem disse: “Muita gente fala em mudar o mundo, mas ninguém quer mudar-se a si mesmo”. As mudanças começam em quem deseja mudança.
Fonte: http://www.isaltino.com.br/
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