Pr. Neemias Lima*
Sentado à margem de um rio de águas cristalinas e calmas, Silas Vieira, sorrindo, lê um fragmento da palavra da vida, deixado por um indiano no tronco de uma árvore frondosa, cuja sombra o cobria... “Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo; pois tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber...”.
Tive fome, tive sede, realça Silas. E, novamente sorrindo, completa a leitura: “...quantas vezes o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes”.
Com passos elegantes, cabeça erguida e sobrenaturalmente feliz, David Malta cantarola uma canção. Silas ouve atentamente: “Brilha no meio do teu viver, brilha no meio do teu viver, pois talvez algum aflito possas socorrer...”.
“Silas Vieira, você por aqui?”, saúda Malta.
“Meu mestre, Malta...”. É interrompido: “A ninguém chameis Mestre, porque há um só...”. Sorrisos! “Sua data de nascimento é, seu casamento foi no dia...”. Mais sorrisos...
“Conte-me”, quer saber David Malta, “está aqui há muito tempo?”.
“Nem sei, aqui conta o tempo?”. Sorrisos e abraços.
Malta traz a cabeça de Silas perto dos seus lábios e sussurra: “Encontrei aqui mesmo esses dias Sadu Sundar Singh, batemos um papo. Ele não vivia o que pregava, pregava o que vivia. Foi um papo muito gostoso! Mas, conte-me, tem novidades?”.
“Pr. David, os cristãos vivem dias muito confusos no Brasil. Os cultos tem liturgia de shows, os pregadores mais preocupados com a performance do que com a Palavra, a Teologia da Prosperidade celeremente ganha terreno, o conceito dominante é de megaigreja com filiais espalhadas, cada vez mais o apego ao dinheiro e poder, e o cuidado com os sofridos...”.
“Mas isso não é novidade, Silas!”, interrompe David Malta. “Nós, os batistas sempre remamos contra essa maré, mas os outros caminham...”.
“Não, não, não... não falo dos outros, falo de nós...”. Silas é interrompido de novo.
“Você quer me dizer que os batistas foram alcançados por esse vírus?”, perplexo, pergunta Malta. Ao que Silas, com a fronte abaixada, consente.
Um coro de africanos passa cantando alegremente na outra margem do rio, o que distrai os dois amigos. A letra provoca um sorriso e abraço nos dois: “Tanta gente vai andando na procura de uma luz, / Caminhando na esperança se aproxima de Jesus / No deserto sente fome e o senhor tem compaixão: / Comunica sua palavra; vai abrindo o coração / Dai-lhes vós mesmos de comer,
Que o milagre vai acontecer! / Quando o pão é partilhado passa a ter gosto de amor, / Quando for acumulado gera morte, traz a dor; / Quando o pouco que nós temos se transforma em oblação: / O milagre da partilha serve a mesa dos irmãos”.
“Malta, Malta, olhe quem vem ali?”, saltita em aleluias Silas.
Sorrisos, sorrisos, abraços, abraços... em trio, cantam juntos, embalados ao som do marejar das águas e suaves cânticos de aves. Depois de um bom bate-papo, Hélcio Lessa caminha em direção à campina verdejante próxima dali.
“Silas, que notícias você tem da Convenção Batista Brasileira?”, quer saber David Malta.
“Davi, a CBB...”, nem completa Silas... “Glória, glória, aleluias, glória, glória, aleluias / Vencido tem Jesus!”, um coro com milhares de japoneses e coreanos invade o local e passa cantando com alegria nunca vista.
Assim que a cena termina, Silas, num grito, exclama: “Malta, olhe ali atrás, em nossa direção!”. Virando-se, Malta vê Fanini com os passos bem definidos, mãos erguidas... Volta o olhar para Silas, silenciosamente refletem e entreolham-se...
“Ué, cadê o Fanini?”, ao voltar o olhar, quer saber Malta. “Saiu ali pela direita”, informa Silas.
O coral de japoneses e coreanos, retornando, mistura todos, Silas e Malta não são vistos mais.
*Pastor da Igreja Batista do Braga, Cabo Frio.
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