terça-feira, 2 de julho de 2013

Protestos no Brasil - II

O QUE VEM DAS RUAS
Cleber Menezes*

“Quem oprime ao pobre, insulta o seu Criador...” Pv. 14:31
          Há latente uma insatisfação da maior parte da sociedade com o sistema tributário brasileiro que muito extrai do cidadão e pouco retorna em forma de benefícios sociais. Esse sentimento ganha contornos dramáticos sempre que cada indivíduo depara-se com a necessidade de usufruir daquilo para o qual tanto contribuiu e não recebe esse serviço adequadamente, sendo forçado, quando pode, a arcar com custos extras. Aquele que, por circunstâncias da vida não tem como fazê-lo, é exposto a constrangimentos que o exercício pleno da cidadania não admite, e fica à mercê de favores e da bondade dos outros.
         Essa insatisfação tem ficado sufocada e estrategicamente controlada, uma vez que o país tem maquiado a realidade com ações políticas pontuais, porém, não estruturais. Assim, os programas que, segundo o governo, permitem a inclusão social, com o passar dos anos, revelam-se paliativos, uma vez que não qualificam o cidadão ao ponto de permitir-lhe incluir-se no mundo do trabalho e, como não ataca a causa do problema, torna-se um modelo gerador de novos dependentes.  Já, na outra ponta, onera as empresas e os trabalhadores com a ampliação de tributos compulsórios para manter a “política do pão e circo” do Estado. Pior do que isso é o mal estar provocado, uma vez que põe os cidadãos em lados opostos: de um lado está aquele que adia os sonhos, pois contribui muito e, do outro, está aquele que é servido dos programas sociais mantidos pelo primeiro e administrados por um Estado ineficiente e corrupto.
         Adiar sonhos por um bem comum é suportável por um determinado tempo, enquanto se percebe que as ações do governo concorrem para o bem estar de todos.  Todavia, o que move os indivíduos é a satisfação pessoal. É o que Thomas Jefferson chamou e “busca pela felicidade”. É para ser feliz e realizar sonhos que cada indivíduo estuda, trabalha, poupa, constrói e qualifica-se. E do somatório desses indivíduos realizados, obtém-se uma sociedade feliz e equilibrada. Quanto mais sonhos realizados por um maior número de pessoas, menos violência e desigualdade social. Mas, se ao contrário, o Estado não converte a tolerância e o espírito colaborativo do povo em políticas que revertam o quadro de debilidade, a consequência é o cansaço, a descrença e a revolta.
          Revolta-se por indignação. Indigna-se ao ver o menos favorecido sendo humilhado por não obter aquilo que lhe é de direito. Indigna-se quando o dinheiro público é jogado no ralo do desperdício, produto do mal uso, do ilícito e da falta de ética e da má gestão da coisa pública. Indigna-se, quando os casos mais evidentes de corrupção são varridos para baixo do tapete da  justiça em acintoso desrespeito ao povo. Indigna-se quando o político ri indecentemente de todos nós a gargalhada da desonra e do jeitinho torto que tanto mata nas filas dos hospitais e ajuda a encher  os presídios com os filhos do analfabetismo e da miséria.
          É natural que emirja nesse momento toda uma crítica da esquerda (socialista, trabalhista, etc.) ao fantasma do neoliberalismo e perceba nessas ausências do Estado os tentáculos desse modelo socioeconômico, tão mal afamado. Mas, para o cidadão comum, essa discussão pouco importa. O que de fato importa é que os impostos são altíssimos, a saúde é péssima, a educação vergonhosa, a segurança é precária e o crescimento do país ínfimo, uma vez que esbarra em questões estruturais absurdas para uma economia do tamanho da nossa e que, em boa parte, sucumbi à burocracia, madrasta da corrupção.
         Assim como na Turquia ficou notório não tratar-se apenas de um protesto contra a reurbanização do Parque Gezi em Istambul, aqui, o que se quer é muito mais do que o barateamento das passagens.
         O pote está cheio. Ainda bem que está transbordando em forma de manifestações pacíficas e ordeiras e, em sua maioria, com a saudável tolerância do Estado. Pior seria a passividade indolente e conivente do povo. Hoje, as ruas estão sinalizando uma direção que não pode ser ignorada. Há um caminho a ser seguido, pautado pela ética e pelo compromisso com o país, e quem não trilhá-lo poderá experimentar o que de pior pode vir das ruas e das urnas.
         A História está repleta de exemplos de sociedades que experimentaram o cansaço com a democracia, e o que veio depois desse cansaço foi sofrimento e dor. Ou o Estado e os políticos agem repercutindo o que vem das ruas, ou o caos baterá à porta de todos, indistintamente.
        Por isso, só podemos desejar longa vida à democracia e à capacidade civilizada de indignar-se!

*Cleber Menezes é professor de História e evangélico.

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